sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Palavras que tecem o bem ou o mal.

O dom da comunicação é uma dádiva e como tantos e tantos atributos pode ser usado para o bem e para o mal. No diálogo Fedro, Platão dizia que a linguagem é um pharmakon. Esta palavra grega, que em português se traduz por poção, possui três sentidos principais: remédio, veneno e cosmético.
Platão considerava que a linguagem pode ser um medicamento ou um remédio para o conhecimento, pois, pelo diálogo e pela comunicação, conseguimos descobrir nossa ignorância e aprender com os outros, ajudamos, curamos, resolvemos.
Pode, porém, ser um veneno quando, pela sedução das palavras, nos faz aceitar, fascinados, o que vimos ou lemos, sem que indaguemos se tais palavras são verdadeiras ou falsas.
Enfim, a linguagem pode ser cosmético, maquiagem ou máscara para dissimular ou ocultar a verdade sob as palavras. Como cosmético tenho um exemplo claro e atual: os políticos. É quando mascaramos as situações / fatos / acontecimentos para torná-los mais "bonitos". Sabe quando os discursos políticos nos enganam, fingindo fazer algo impossível (como prometer salário mínimo de mais de mil reais)? Pois é bem isso aí mesmo. É quando usamos a ironia - não para ofender - mas para enganar. Pra que serve um cosmético? Para embelezar, melhorar, aprimorar. E é assim mesmo que a palavra usada como cosmético funciona.
Na abertura da sua obra Política, Aristóteles afirma que somente o homem é um "animal político", isto é, social e cívico, porque somente ele é dotado de linguagem. Só temos uma sociedade e cultura graças à comunicação. Ela é quem nos fez gerar relações sociais. Através da linguagem verbal e não verbal. E por ser de extrema importância que podemos perceber que é um claro instrumento de dominação.
Na época da colonização, um modo da metrópole efetivar sua dominação era impondo a língua-pátria. No Brasil não foi diferente. Inclusive, a primeira atitude de dominação pela linguagem foi através do Marquês de Pombal, em 1877, quando proibiu o ensino de qualquer língua, em todo território nacional, que não fosse o português. Isso porque as línguas mais faladas em nosso país era o tupi e o tupinambá. Nos EUA temos um exemplo interessante, após a independência, foi criado o dicionário de inglês americano, para se diferenciar da Inglaterra, sua antiga metrópole.
Mas, até hoje temos casos claros e explícitos de dominação. Uma delas é através do pedantismo. Pedantismo. Sempre achei essa uma palavra feia. Feia mesmo. Pe-dan-tis-mo, o significado também o é. Ao utilizar palavra rebuscadas, expressões complexas e inclusive em outro idioma - o que se difere de estrangeirismos -, faz-se valer de uma cultura de dominação pelo saber: "eu sei mais que você", "eu tenho mais estudos", e por aí vai. Não que eu defenda ser simplório. Longe disso. Apenas devemos refletir sobre ser conveniente ou não. Para que ser rebuscado entre pessoas humildes e sem tanto conhecimento?
Esse rebuscamento sem precisão também incide sobre o profissionalismo. Imagine uma conversa informal com um médico que somente use termos técnicos que não sejam de fácil compreensão? Seria perfeito em uma convenção médica, mas informalmente deixa a desejar. Sem contar a má impressão. E há muitos casos assim. Diversos profissionais se utilizam dessas expressões técnicas para se impor, para se mostrar, chamar atenção. E isso também é um modo de dominar, de oprimir.
A comunicação é realmente uma dádiva. Ela pode ser remédio, veneno, cosmético, de acordo com seu falante - e também de seu ouvinte. A oratória faz culminar amores, desprezo, desilusões. Tudo com simples palavras. Mas, você é quem escolhe como serão suas palavras. Remédio, veneno, cosmético ou dominação?

Texto de Luciano Ribeiro

Parte das idéias desse texto se encontram no artigo de Marilena Chaui "Convite à Filosofia".
Postado por: Rosa Maria Olimpio

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